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A regra é clara: quanto mais comércio e divisão de trabalho, maior a riqueza do povo


Em uma das passagens mais importantes (e menos lidas) de seu clássico “A Riqueza das Nações”, Adam Smith observou a forma de organização da produção em uma fábrica de alfinetes. Dividindo-se o trabalho em distintas etapas, a produtividade dos trabalhadores é muito maior do que seria caso cada trabalhador se ocupasse autonomamente de todas as fases da produção de um alfinete. Esta divisão permitiria que cada trabalhador se especializasse e aperfeiçoasse na função para a qual foi designado.


O aumento na produtividade dos fatores de produção decorrente de trocas livres baseadas na divisão do trabalho seria, segundo Smith, o caminho por meio do qual as nações tornar-se-iam ricas. Ocorre que, como percebeu o economista escocês, as possibilidades de divisão do trabalho são limitadas pelo tamanho do mercado a que se tem acesso.


Imagine-se, por exemplo, vivendo sozinho em uma ilha deserta onde só é possível consumir aquilo que é produzido. Como você não dispõe de outras pessoas para cooperar realizando trocas (um mercado), você só consumirá aquilo que você mesmo for capaz de produzir. Ainda que você seja uma pessoa extremamente hábil, você será necessariamente muito pobre, pois terá que alocar seu tempo limitado a atividades das mais básicas (garantir abrigo, comida, bebida e segurança para si mesmo, por exemplo).


Agora digamos que você descubra não estar sozinho na ilha: também vive lá uma família de náufragos. A probabilidade de que entre eles exista alguém que produza bens e serviços por você demandados de maneira mais eficiente (com menores custos relativos [i]) é grande. O fato de você ser o melhor cozinheiro da ilha não significará nada se houver outros cozinheiros quase tão bons e se, ao mesmo tempo, você for a única pessoa com conhecimentos de carpintaria nos arredores, ainda que você não seja propriamente um expert.


O que conta na divisão do trabalho é a vantagem comparativa na produção de determinado bem ou serviço [ii]. Inserido em um mercado composto por mais agentes, você poderá focar seu tempo, sua habilidade e sua energia especializando-se naquilo que produz com mais eficiência, trocando seus excedentes por bens e serviços produzidos por outras pessoas. A especialização permitirá ganhos em escala, bem como os benefícios do learning-by-doing. É fácil perceber que nesse cenário você e os outros habitantes da ilha teriam uma melhora considerável em seu padrão de vida.


A mesma lógica vale para agrupamentos humanos maiores, como cidades e países: quanto maior o âmbito de interações livres, maiores serão as possibilidades de divisão do trabalho. Como consequência desse fato, maior será a especialização, gerando uma alocação mais eficiente dos recursos disponíveis. Essa melhor alocação importará necessariamente em maior riqueza e bem-estar dentre os membros da comunidade em questão.


Devido ao anacrônico protecionismo que ainda vigora por aqui, o Brasil tem hoje uma participação pífia no comércio internacional, limitando severamente as possibilidades de especialização e divisão do trabalho daqueles que vivem sob suas fronteiras. Apesar de suas proporções continentais, o país é hoje apenas a 24ª nação exportadora do mundo, e a 21ª maior importadora. A consequência óbvia disso é a limitação das possibilidades de comércio baseadas na divisão do trabalho para consumidores e produtores de bens e serviços no Brasil.


Em contraste, os cerca de cinco milhões de habitantes da pequena Cidade-Estado de Cingapura (área equivalente ao dobro da cidade de Porto Alegre) beneficiam-se da participação do país em diversos acordos de livre comércio – o que possibilita aos cidadãos cingapurianos o acesso a um mercado muitas vezes maior do que aquele ao alcance dos brasileiros. Esta ex-colônia britânica ascendeu da pobreza a um nível de riqueza invejável se abrindo ao comércio internacional e ao investimento estrangeiro. Não por acaso, é hoje o país com a maior proporção de famílias milionárias do mundo, com PIB per capita quase seis vezes maior que o brasileiro. Quanto maior o comércio e as possibilidades de divisão de trabalho, maior a riqueza do povo de um país.


[i] Não confundir com o custo monetário, pois pode ser mais eficiente que um trabalhador menos produtivo realize determinada tarefa contanto que o seu custo de oportunidade – aquilo de que se abre mão para obter algo – seja menor.

[ii] Esse conceito, fundamental na compreensão da lógica do comércio internacional e da divisão do trabalho, foi introduzido por David Ricardo em seu On the Principles of Political Economy and Taxation(1817).


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